APRESENTAÇÃO

Qual é a situação atual dos estudos filosóficos no Brasil e na América Latina? Por que nos departamentos de filosofia não são ensinados os filósofos brasileiros e latino-americanos? Não sendo eles considerados genuinos filósofos, qual é a noção de filosofia que se utiliza para operar tal exclusão? Quais são os pensadores que Brasil já teve? Fomentam os departamentos de filosofia o desenvolvimento de filósofos? A 39a Semana de Filosofia da UnB se propõe refletir sobre estas questões, convidando 6 estudiosos do pensamento nacional e latino-americano, 3 deles coordenadores dos mais importantes grupos de estudo de Filosofia no Brasil.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

PALESTRA DE RODRIGO DANTAS, “TRADIÇÃO, RUPTURA E CRIAÇÃO: SOB QUE CONDIÇÕES É IMPRESCINDÍVEL FILOSOFAR?” (DIA 9 DE JUNHO, 9 HS)



(RESUMO E COMENTÁRIOS DE JULIO CABRERA).

Rodrigo Dantas começou a sua fala colocando a questão: existe uma filosofia brasileira que tenha hoje desenvolvido uma tradição de pensamento com uma influência nacional, continental ou internacional no acontecimento histórico-mundial? A primeira resposta a esta pergunta parece óbvia: não!  É claro que há no Brasil pessoas que escrevem sobre filosofia, que vão a congressos de filosofia, que praticam atividades filosóficas; mas não há um reconhecimento geral prático concreto, nacional ou internacional, de algo como uma “filosofia brasileira”. 

Mas, num segundo momento, ele se questiona sobre qual o sentido que ainda poderia ter hoje perguntar-se por uma filosofia nacional num mundo cada vez mais cosmopolita, mais globalizado, onde o que mais interessa é achar vínculos de igualdade entre todos os seres humanos do planeta na base de necessidades comuns. Menciona o antecedente de Jesus que disse há 2000 anos atrás: “Não há mais gregos, nem judeus, nem senhores, nem escravos, nem homens nem mulheres; não há distinção entre as pessoas perante Deus”. Hoje, suprimido Deus, ainda podemos reivindicar o mesmo para nosso tempo: não há diferenças entre as pessoas, e em particular não há diferenças nacionais que sejam relevantes. A idéia de nação, de nacionalidades com suas diferenças e oposições fortes a respeito de outras nações é a herança milenar da sociedade de classes; hoje vivemos num mundo onde queremos acentuar as semelhanças, tudo o que é comum. Trata-se no momento atual de ver o que nos une e não o que nos separa, abolir todas as fronteiras. 

O Brasil, em particular, sempre se caracterizou por acolher a todos, vindos de todas partes do mundo, nesse viés antropofágico dos dois Andrade. Brasil, em sua própria constituição, seria como uma espécie de autoconsciência desse espaço híbrido, desse internacionalismo visceral, como pátria espontaneamente cosmopolita, contra toda afirmação forte de peculiaridades nacionais. É claro que, como país parido na colonização e a exploração, Brasil, como os outros países latino-americanos, auto-afirmaram historicamente suas nacionalidades como uma forma de reivindicação; o nacional como resistência à opressão. O internacionalismo abriga o perigo da colonização, da despersonalização, do imperialismo, primeiro português, depois francês, depois norte-americano e atualmente mundial. Nesse contexto imperialista, acentuar o nacional pode ser uma afirmação de identidade, de resistência, de luta contra a opressão colonial. 

Foi desta forma que surgiu a questão do pensamento nacional em muitos clássicos do pensamento latino-americano, como José Marti, Simon Bolívar, Juan Carlos Mariátegui, Sánchez Vasquez, Enrique Dussel e tantos outros; e assim surge igualmente na tradição do pensamento brasileiro (Darcy Ribeiro, Mário e Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda, Florestan Fernandez, Paulo Freire, etc). Este pensamento latino-americano, inclusive, precedeu estritamente a questão do “nacional” de cada pais. Há reconhecimento mundial sobre a existência deste pensamento brasileiro e latino-americano. Então, este momento de afirmação nacional contra o imperialismo deve ser resgatado, mas sempre atendendo a que isso também pode transformar-se em nacionalismo, em xenofobia, em sionismo, etc. 

Mas também a luta se globalizou. Atualmente vivemos uma realidade histórico-mundial, um acontecimento histórico-mundial no qual se insere necessariamente uma boa parte dos projetos de luta, de resistência contra a opressão, dado que a própria dominação está hoje globalizada. De tal forma, a pergunta hoje é como se inserem os pensamentos nacionais (argentinos, brasileiros, europeus) dentro de uma sociedade globalizada de exploração, de imperialismo, de divisão do trabalho, de produção e exploração. Os movimentos emancipatórios deixaram de poder ser pensados hoje dentro dos limites de nações; não há mais lugar atualmente para “projetos nacionais”, e talvez eles nunca existiram. A filosofia é hoje histórico-mundial ou não é nada. Devem ser pensadas as categorias que permitem entender essa determinação do nacional (brasileiro, argentino, europeu) pelo histórico-mundial. E este o marco onde deveríamos buscar o sentido que tem hoje perguntar por uma “filosofia brasileira”.

No Brasil, o maior dos países periféricos, quase tudo está hoje em mãos estrangeiras, tornando ilusória a idéia de um projeto nacional brasileiro. O Brasil se transformou na plataforma latino-americana do imperialismo internacional. Sessenta por cento das empresas brasileiras estão em mãos dos capitais estrangeiros, com o apoio dos interesses da burguesia nacional. Isto tem evidente impacto no plano da produção de idéias. De tal forma, as condições que permitiriam a formação de um pensamento nacional não existem mais. Nenhum pensamento ou processo social pode hoje existir sem um reconhecimento e desenvolvimento na escala global. Uma filosofia brasileira deveria indagar-se sobre essa realidade histórico-mundial. E precisa se envolver numa luta também ela globalizada. 

É nesse contexto que tem sentido perguntar-se em que condições sociais, políticas, econômicas, históricas, existenciais se desenvolveu, de fato, uma filosofia européia, e por que esse modelo está atualmente em crise. Ou seja: a própria Europa, com seus países hegemônicos, está hoje se questionando sobre essa realidade. Os jovens espanhóis, por exemplo, estão em protesto pelas atuais condições de vida das futuras gerações, que serão piores que as de seus pais. As ocupações de praças na Europa apontam para uma busca desordenada de novas formas de organização política, o anseio de que algo tem que se modificar, mesmo que os próprios participantes dessas manifestações não saibam bem como começar ações realmente eficazes. Mas eles sentem que o sistema mundial está em crise e é insustentável (“Não somos nós que estamos contra o sistema, é o sistema que está contra nós”). Os jovens espanhóis e franceses já se consideram “europeus” muito mais do que espanhóis ou franceses; as identidades nacionais (“francês”, “árabe”) se tornaram obsoletas.  

A resposta à pergunta pelas condições de uma filosofia européia é: essa filosofia se desenvolveu em momentos revolucionários (as revoluções burguesas, a revolução francesa, a revolução industrial, e depois as revoluções socialistas, etc). Para uma filosofia latino-americana poder surgir, faz-se necessário derrubar a concepção de mundo anterior, como aconteceu no mundo grego, romano, hebreu, europeu. De fato, o processo da atual organização da sociedade já está no fim, e o pensamento europeu é uma racionalização das condições globais de existência da sociedade atual, que será necessariamente derrubada, derrubada por todos nós, não por nenhuma tradição nacional isoladamente; ou será assim ou não será feito por ninguém. Terá que haver um intercâmbio global de mercadorias, de pessoas, de saberes, que construam uma nova organização. Neste contexto, a existência de uma tradição de pensamento é determinada também por essas relações globalizadas. 

O Brasil, pela sua própria constituição, já é internacional e globalizado. O Brasil pode conceber hoje a sua identidade como antropofagia, como mistura, e isso explica em parte porque o Brasil está hoje na moda na Europa. Esta seria como uma terceira via entre nacionalismo e colonialismo: a antropofagia, a mistura, a abertura a tudo. Diante dos velhos nacionalistas, os jovens franceses, por exemplo, escutam músicas árabes; a mistura musical está na ordem do dia, criando-se outras sonoridades desagradáveis para os ouvidos nacionalistas, tanto árabes quanto franceses; dilui-se cada vez mais a idéia mesma de nação. Nesse contexto, a atitude é: estar aberto a todas as influências a partir de uma antropofagia híbrida; o exemplo da música popular brasileira pode servir de exemplo: o caso de Gilberto Gil e os mutantes, o uso do amplificador, diante do qual muitos previam como o fim da música popular brasileira, e que acabou sendo mundialmente reconhecida; isto foi algo totalmente divorciado de qualquer nacionalismo, mas, ao mesmo tempo, algo singularmente brasileiro. Isto parece um convite para sair do eixo nacionalismo vs colonização; o nacionalismo deixou de ser uma alternativa válida para a dependência. 

Não são mais os indivíduos os que decidem o que filosofar ou porque filosofam ou sobre o que filosofam, mesmo que lhes pareça assim; tem que se perguntar como o filosofar liga-se com o acontecimento histórico-mundial, esse é o grande tema. Tem que haver uma ruptura com as tradições anteriores; como uma filosofia pode se transformar num acontecimento histórico-mundial, não de maneira isolada, sem se apoiar na genialidade individual; a filosofia está indissoluvelmente ligada a historia universal, e ela tem que ter efeitos práticos, não puramente contemplativos. A prática é o critério da verdade. A filosofia tem existência quando tem capacidade de desencadear acontecimentos historico-mundiais. E tem que se perguntar como o Brasil poderia fazer isso. 


COMENTÁRIOS:

Esta palestra foi uma das mais importantes da Semana, e me fez sentir um pouco o provincianismo em que nós mantemos ainda no Fibral as questões de filosofia no Brasil; como se todo o problema estivesse centrado no que acontece nos departamentos de filosofia. Aqui Dantas nos mostra – mesmo que dentro dos limites de rigorosas categorias marxistas – que o problema é muito maior, que ele é planetário, global, multi-abrangente; que a problemática do comentarismo e da produção própria de filosofia deve passar por uma reflexão social, econômica e política de grandes dimensões. 

Perguntar-se pelas condições – hoje em profunda crise – do filosofar europeu, e das conseqüências dessa derrubada dos valores hegemônicos para o nosso próprio filosofar. Nós continuamos a visualizar Europa como país hegemônico, poderoso, que da as cartas não só na filosofia; mas Dantas mostrou uma Europa híbrida insegura, em crise, decadente, como um monstro que cai e do qual devemos nos cuidar para que não nos esmague na sua magnífica queda; uma Europa talvez mais perigosa no seu declínio do que em seu auge. 

Assim, a pergunta pelo “haver” ou “não haver” filosofia brasileira passa pelos mecanismos – hoje globalizados – de produção do conhecimento, aceitando-se aqui a minha idéia deste não ser, em absoluto, um problema “ontológico”, mas de construção política. Seja o que for essa filosofia brasileira, Dantas nos diz, ela não mais poderá surgir de um “projeto nacional”, mas de um debruçar-se em cima da situação globalizada que hoje constitui ontologicamente o conhecimento e seus desdobramentos. 

De todas formas, na discussão que se seguiu à palestra, ficou claro que o nosso pensamento acerca da noção de “desde o Brasil” – idéia desenvolvida em meu texto “A questão da filosofia no Brasil no contexto da reflexão sobre civilização e barbárie no pensamento argentino”, que Dantas conhece e mencionou na sua palestra – não deve entender-se como um tipo de “projeto nacional” (e Dantas fez questão de frisar que assim tinha entendido ao ler o texto). Não se trata de um “desde” nacional, mas histórico-politico-existencial, algo que deve ser feito na história. 

Na minha intervenção, eu coloquei que embora na macro-política todos os países do mundo estejam globalizados, ainda no plano da micro-política continua havendo prerrogativas e privilégios dos países europeus sobre os nossos (por exemplo, na presença de Habermas e a ausência de Mariátegui em nossos curricula de filosofia política). Pois se temos que renunciar a projetos nacionais, Alemanha também teria que renunciar aos seus. Assim, parece que, no plano macro-político, há globalização para todos, mas no micro-político, parafraseando Orwell, alguns países estão mais globalizados que outros.

Então, eu tenho ainda um pouco de receio acerca deste projeto de “igualdade”, de “derrubada de todas as fronteiras”, de “Pátria global”, porque me parece que, agora no plano globalizado, se reproduzem as condições de desigualdade e exploração que existiam na época dos projetos nacionais; de maneira que parece haver algo, uma força muito poderosa, que atravessaria a distinção nacionalismo-globalização, e dentro da qual ainda valeria a pena insistir num pensamento-desde, antes de entrar de cabeça dentro da “realidade histórico-mundial”; pois tampouco esta “realidade” é um dado bruto; ela é tão construída quanto os antigos conceitos de nação.  

Me parece que esse “acontecimento histórico-mundial”, que reúne tudo aquilo comum ao humano, é um produto tardio de um Iluminismo euro-cêntrico, ainda presente no pensamento de Marx; a globalização à qual temos forçosamente – segundo Dantas - que nos referir, é também uma invenção do capitalismo; parece então que somos novamente convidados a pensar e agir em referência às vicissitudes do capitalismo. Parece-me que a antropofagia propõe, na verdade, uma outra forma de globalização (e talvez isto foi precisamente o que Dantas tentou dizer); uma globalização híbrida, múltipla, anti-imperialista. Mas a antropofagia aponta também na direção contrária a qualquer globalização: a um certo tipo de marginalização, de experiência profundamente local. 

Este foi o sentido, me parece, de uma das questões colocadas por Wanderson Flor no debate, de que lhe parecia problemática a dicotomia, colocada por Dantas, de “ou o histórico-mundial ou nada”, salientando ainda uma reivindicação do local e destacando os problemas da antropofagia como conceito elitista. Se o antropofagia é universalizada pode nos pregar peças quando tal conceito for assumido por setores conservadores (como quando imperialistas assumem o ponto de vista multi-cultural e elogiam a diferença); a antropofagia foi uma elaboração elitizada de uma experiência particular. Rodrigo admitiu que os conceitos se modificam nas mãos de quem deles se apropriam, como aconteceu mesmo com Jesus e com Marx. De todos modos, mesmo as singularidades só poderão hoje ser reivindicadas dentro de projetos conjuntos, mundiais, em torno do comum (como mostrou surpreendentemente o protesto indígena do Equador, que fez um governo cair, e sem que nem os próprios protagonistas pudessem acreditar na sua força). 

Nessa mesma linha eu me pergunto: não poderá ser este portentoso convite ao global uma estratégia para desativar o potencial revolucionário do local, do marginal, do provinciano? Ao que a perspectiva globalizadora poderá responder, talvez, que mesmo a noção de “local” poderia ser uma invenção da própria globalização. 

Conferência do professor CARLOS PÉREZ ZAVALA (Universidad Nacional de Rio Cuarto - Argentina): “Arturo A. Roig y la decolonialidad”. Dia 8 de junho, 9h.




Por Orlene Barros
   
 Ao longo da conferência, Pérez Zavala buscou delinear o pensamento de Arturo Andrés Roig (Argentina) em torno do teor crítico e rigor acadêmico desse pensamento. Assevera ser Roig um representante genuíno do pensamento latino-americano, pois, de certa forma, resume e perpassa os pensamentos de José Gaos (Espanha-México); de Augusto Salazar Bondy (Perú); de Enrique Dussel (Argentina-México), colega de Roig; de Leopoldo Zea (México); e de Horacio Cerutti Guldberg (Argentino), discípulo de Roig.
  
O pensamento de Roig trata de revisar a ontologia latino-americana e, no enviesamento dessa ontologia por discursos coloniais universalistas, de romper e refundar as questões da universalidade e da colonialidade, a partir de uma desestabilização da cosmovisão eurocêntrica. Para tanto, recorre a análise dos mitos europeu e americano sobre a origem do homem, recorre também a análise das categorias “Oriente” e “Ocidente”, demarcando diferenças e inversões, atravessando a filosofia da história, acenando a constituição ideológica dos empreendimentos humanos, e por decorrência da filosofia, acabando por culminar numa ontologia latino-americana tão somente avistada, e numa ampliação metodológica que permite o pensamento latino-americano situar-se e descobrir-se.

O mito europeu e o mito americano conformam diferentes cosmovisões e metáforas acerca da verdade do ser. Uma metáfora do mito europeu é o pensamento hegeliano. Na Fenomenologia do Espírito, a dimensão ôntico-ontológico se dá na dialética entre escravo e senhor, se dá em oposições entre corpo e alma, vontade e espírito, sediando na alma o campo da verdade do ser, da operação do espírito; o que acaba por legitimar diversas perspectivas colonialistas em suas verdades espirituais e pretensões dominadoras.

Em contraposição, o mito americano se alimenta de metáforas questionadoras da historicidade européia, forçando uma abertura para outras experiências originárias, para o campo da verdade do ser em torno do fazer-se humano, da vontade de gestar-se. Para superar a tradição dualista alma-corpo, que caracteriza a metafísica ocidental, Roig resgata a fábula heideggeriana da Cura, em Ser e tempo, sendo a Cura um esforço angustiado do homem para sair da dualidade originária. Além disso, Roig resgata a narração mítica da origem do humano no Popol Vuh, livro sagrado do povo Quiché. Ambos os resgates apontam para a prioris diferentes ao a priori epistemológico da tradição européia: pré-ontológico heideggeriano aponta para um a priori hermenêutico-existencial; narração mítica da origem humana do Popol Vuh aponta para um a priori antropológico.

Inclusive, ressalta Pérez Zavala, o prioritário para Roig é o homem, constituindo o a priori antropológico uma categoria fundamental no pensamento de Roig. O que marca a distância entre Roig e Heidegger, pois Heidegger se debruça no ontológico, não no antropológico. Roig então se insurge contra o pensamento heideggeriano, por ficar o humano pré-estabelecido analiticamente num corpo modelado de barro e vivificado por um sopro divino; para Roig, resquícios do reino do espírito. À diferença do modo analítico heideggeriano de acercar-se do humano, o modo de Popol Vul é de natureza sintética. Busca-se uma matéria com o princípio de totalidade do ser humano, não uma matéria passiva e alheia ao humano. Daí os deuses terem feito o humano de “pasta de milho” (echá), depois de terem fracassado com o barro. A matéria não necessita de sopro vivificador prévio, ela é dotada de uma potência de vida, com impulso próprio do milho, substância que se identifica também com o alimento que o homem prepara para seu sustento. O humano surge aqui como criando-se a si mesmo, radicado não na espera da morte heideggeriana, mas no trabalho, de onde surge o alimento e a plenitude humanas. Assim, o ser do humano fica referido à criação da cultura mediante o trabalho.

Outra distância aqui é marcada, agora entre Roig e Hegel, com linhas de inversão da filosofia hegeliana da história. Enquanto para Hegel a história está feita e recorre ao passado, daí a metáfora que a filosofia levanta vôo ao entardecer, para Roig estamos no começo da história, não no seu fim, a filosofia levanta vôo ao amanhecer, com a imagem de aves americanas cantoras, de uma ave cantora auroral. No empreendimento hegeliano, não há espaço para a utopia.

Junto com a inversão da filosofia, se dá tanto uma exigência de abertura rumo ao utópico, como uma crítica da razão política. Pérez Zavala assinala com Roig e León Pinelo o fenômeno da inversão, como sendo um modo de reconstruir o pensamento latino-americano, permitindo elaborar outros discursos, com o poder de uma dialética criadora. Roig vê na obra de León Pinelo, El paraíso en el Nuevo Mundo, uma linha de inversão da cosmovisão eurocêntrica, a partir de uma categoria nova, a de peregrino. O conceito de história peregrina acaba por ser um belo esforço de inversão dos códigos vigentes. A inversão acompanha o pensamento crítico. Para Roig, restabelecer as inversões é um modo de reconstruir o pensamento de nossa América.

Léon não põe em dúvida que a história marcha do Oriente em direção ao Ocidente. Não obstante, relativiza os termos Oriente e Ocidente, na multiplicidade de suas vozes, sendo essas vozes verificadas em qualquer lugar do mundo. Inclusive, para León, Oriente e Ocidente ficam referidos às partes que me nasce e que me põe o sol, sem cair no subjetivismo, filiando-se a momentos peregrinos de nascimento na história. De acordo com Cólon e León, América produz o Nascimento, América é o Oriente; a origem da humanidade remonta às bacias hidrográficas amazônicas... e a história mundial se deslocou da América rumo ao Ocidente através do Oceano Pacífico. Pérez Zavala se pergunta: Pura imaginação? Responde que tampouco é assegurada a origem da humanidade entre o Tigris e o Eufrates. Com isso, Roig e Léon dissolvem as categorias Oriente e Ocidente como pontos fixos, relativizando o mito europeu, incorporando e valorizando o continente americano na história mundial.

Pérez Zavala continua explorando agora as categorias interculturalidade e heterogeneidade, para situar ainda mais a filosofia da liberação (ou libertação) de Roig. Para isso, traz o debate Roig/Raúl Fornet-Betancourt (cubano, residente na Alemanha). Fornet critica a mentalidade colonial de Roig, desde a perspectiva de uma teologia da liberação, algo anterior a uma filosofia da liberação. A interculturalidade, para Fornet, não indica nem uma posição teórica, nem um diálogo entre culturas. Reconhece Fornet o aporte da filosofia latino-americana, mas critica sua insuficiência, na qual as culturas aparecem reduzidas e selecionadas, pelo uso colonizado da inteligência, pela visão tributária da modernidade européia, pela opção da escritura em detrimento da tradição oral, pela redução da realidade cultural latino-americana ao mundo da cultura mestiça (mescla entre espanhol e americano).

(Pérez Zavala lembra que a interculturalidade nasce muito longe da Academia, em movimentos tribais e sociais que somente depois reverberam na Academia. Continua nos lembrando que o discurso intercultural é relativamente novo, mas não a exigência de respeitar a diferença, exigência registrada já em Francisco Bilbao, Eugenio Maria de Hostos, Pedro Henríquez Ureña, inclusive em José Ingenieros numa linha positivista, para quem o Brasil nunca seria uma grande potência devido à presença massiva de negros; sendo que Ingenieros acabou se retificando no final da vida, afirmando que o Brasil deve muito de sua potência a mistura de raças. Pérez Zavala aproveita e estende o argumento para a Europa: Por que a Europa dura tanto? Pérez responde: Europa é o produto de maior mestiçagem da história da humanidade.)
Ainda sobre a interculturalidade, Fornet considera que a mobilização dos indígenas e dos afroamericanos em torno da recordação dos 500 anos das Américas, em torno do evento de 1992, fundou não uma teoria, mas uma prática social, e pergunta se a filosofia latino-americana soube ler 1992. Segundo Pérez Zavala, a resposta mais importante de Roig sustenta uma posição crítica: nem encontro de dois mundos, nem encontro entre duas culturas. 1992 convoca a falar de conquista como um ato de imposição! Em 1492, América não foi descoberta, senão avistada! Roig assevera: Estamos descobrindo América.

Fornet dirige outra crítica a Roig: Roig versa sobre uma história compartilhada com ferramentas culturais comuns a conquistadores e conquistados, tomando como eixo do pensamento latino-americano identidades mestiças (mescla entre espanhol e americano) e crioulas (descendentes de espanhol), sem revisar criticamente a gênese da própria identidade, sem reconhecer como filosofia outras matrizes étnicas de pensamento, como as matrizes indígenas.

Pérez Zavala diz ser a filosofia intercultural de Roig uma espécie de etnofilosofia, na qual haveria relações entre culturas e etnias. Ademais, afirma que Roig reconhece a diversidade cultural da América Latina (aymara, mapudungu, asteca, inglês caribenho) em textos como Globalización y Filosofia latinoamericana e Filosofia latinoamericana e Interculturalidade. Assume Roig a interculturalidade apenas se acompanhada de críticas da cultura e da filosofia, num imperativo de decodificação ideológica do diálogo intercultural.

Não obstante, num sentido autocrítico, Pérez Zavala reconhece que a filosofia da liberação precisa superar certas limitações, diante dos privilégios dados ao “rosto ocidental”, a “cara latina” do continente, esquecendo outros rostos e vozes, como os das tradições indígenas ou afroamericanas. Essas limitações se constituem desafios de transformação cultural do pensamento latino-americano. Junto ao avistamento da América e ao imperativo de descobrir-se está o imperativo de transformar-se. Eis a advertência de Perez Zavala: Situa a filosofia latino-americana entre um momento crítico e desconstrutivo e outro momento de renascimento e construtivo, a fim de resguardar a polifonia da América Latina. A questão da universalidade fica redimensionada para além dos universais dominantes e colonialistas. Pérez Zavala nos alerta: Precisamos de universais que nos dizem respeito, distintos de dominação. Afinal, como diz Aristóteles e Santo Tomás, universal se diz de muitas maneiras, e como defende Pérez Zavala, de maneiras livres, na defesa de universais próprios, de culturas e humanismos singulares, mesmo incorrendo em universais insuficientes, insuficiência ligada ao próprio projeto de ser humano.

A filosofia latino-americana nos termos de uma filosofia da liberação é confrontada ainda com o discurso da pós-modernidade, com vistas a atentar-se para formas disfarçadas de dominações, já que, conforme Roig, podemos recair em formas de sujeito do idealismo, tanto de sujeito burguês disfarçado de espírito, como de não-sujeito pós-moderno irremediavelmente ideológico. A pós-modernidade é um dos desdobramentos da profunda perda da fé na razão como o princípio ordenador das coisas humanas. Acompanha esse universo pós-moderno a debilitação do pensamento, a neutralidade política, o pragmatismo fundacionista e negador da utopia (da força projetiva da utopia). O universo pós-moderno acaba se convertendo em universalismos, quando se coloca imune a ideologias, a utopia, etc.

Cravando distância da perigosa armadilha do pós-moderno, Roig afirma que a filosofia latino-americana resulta mais numa narração, num relato, com componentes especulativo e emancipatório, convidando consciências a desvendarem ideologias, distanciando-se de fanatismos e aproximando-se de parcialidades, preservando a força projetiva da utopia. No exercício da suspeita a práxis tem a palavra, é a práxis que nos depara com conflito, uma categoria histórica que cerca homens históricos situados; e o teorizar acompanha a historicidade do que se vive. Assim, a própria narrativa do pensar latino-americano vai se constituindo historicamente, num saber histórico, em filosofias da história. Cabe a filosofia assumir a problemática do relato e revisar criticamente esse saber histórico, a fim de comprometer-se com a construção de uma filosofia latino-americana.

Pérez Zavala nos lembra que, diferentemente da pós-modernidade e de seus pragmatismos fundacionistas, a filosofia latino-americana combate os fundamentalismos e as totalidades absolutas, baseando-se em razões, na racionalidade discursiva. O que não implica que a filosofia latino-americana negue todo tipo de generalização, como faz a pós-modernidade quando renuncia à razão, entregando-se aos perigos do discurso brando do mundo pós Guerra Fria: desarme das consciências, abrandamento ético, abandono da crítica, aceitação do vigente, conciliação e resignação, renúncia ao compromisso, desprendimento institucional, atomismo social.

Os pós-modernos destroem a razão por suas pretensões funestas de dominação. Todavia, para Roig, ao se refugiar no particular, no fragmentário, nas redes flexíveis e incomensuráveis de jogos de linguagem, no distanciamento de conflitos sociais, os pós-modernos acabam por colaborar com o projeto neoliberal e seus esquemas de fragmentação das estruturas sociais, sem que a denúncia do terrorismo da razão impeça aceitar a imposição daqueles universais atinentes ao mercado financeiro. A misologia nasce do descortinamento da verdade ideológica dos universais, agravando-se no caso dos pós-modernos, pois o rechaço à razão e seus universais despreza previamente uma teoria crítica. De outro modo, o desprendimento da razão e da possibilidade do sentido, em favor da prática e do puro significado impossibilita a própria crítica, tornando invisível o conflito social e seu poder de operar desdobramentos, incluindo a insurgência.

Já a insurgência passa pela consciência, pela prévia tomada de consciência das condições de nossa historicidade, para a intervenção na realidade. Pérez Zavala passa então a defender a importância de incorporar a temática da linguagem nas filosofias, pois ela permite questionar as condições de aparecimento dos fatos sociais, do que nos acontece. Com o giro lingüístico husserliano, consciência é consciência (de) algo, o que aparece enquanto coisa é linguagem. Discurso não é linguagem. Discursos operam sem consciências. A oportunidade da língua é de justamente encaminhar consciências críticas, para além da racionalidade moderna capitalista.

Pérez Zavala esclarece então o projeto de ampliação metodológica de Roig. O giro profundo para abrir as ciências humanas passa por reconhecer a ideologia tanto no discurso cotidiano, como no discurso filosófico, no caráter oculto e, por vezes, encobridor da ideologia; por superar os limites nacionais do fazer filosófico-historiográfico das ideias, em direção a panoramas de tipo regional continental; por mudar a noção de sujeito histórico do pensamento filosófico, até então reduzido ao estudo de um determinado grupo social, os intelectuais; por enriquecer a análise das ideias mediante uma compreensão das condições dentro das quais se dão; e, como conseqüência de todo anterior, por uma ampliação dos recursos documentais.

Final, mas não banal, Pérez Zavala nos alerta para as conseqüências de uma “episteme pós-moderna” ou “episteme pós-ilustrada”: o rechaço à continuidade e a predileção pela descontinuidade e fragmentação constituem opções que deixam de lado fatos, textos e autores. Faz um convite para pensar a história por entre epistemes, nos espaços vazios que ligam as epistemes, numa espécie de megarrelato que incorporam pensamento crítico e pequenas histórias. É desse modo que Pérez Zavala acompanha Roig na tarefa latino-americana de transcender a historiografia tradicional a partir de uma filosofia crítica.

Intervenções

Na abertura da Conferência, e depois na abertura às falas do público, Julio Cabrera levantou o caráter desafiador dessa Conferência para esse evento e para outros futuros, dentro da proposta do grupo Fibral de estender para América Latina a discussão da ampliação e do vigoramento do espectro filosófico na Academia e fora dela. Brasileiros e hispano-americanos não compartem referências histórico-culturais, o que coloca questões metafilosóficas e práticas imediatas: em torno de investigações de discursos racionais dominadores e dos mecanismos políticos de invisibilização dessas referências; em torno do esforço de interação, da apropriação mútua das referências latino-americanas e da construção de referenciais próprios e singulares. O desafio de apropriação permanece, inclusive na escrita desse texto, quando, por vezes, a escrita foi interrompida para acercar-se das referências suscitadas na Conferência de Pérez Zavala.

Já no início das falas do público, Wanderson Flor coloca a espinhosa relação entre desconstrução da colonialidade (decolonialidade, descolonização) e racionalidade moderna, pois, em última instância, Roig se vale da mesma razão moderna no seu projeto de decolonialidade, numa tentativa, segundo Wanderson, de salvar os universais a qualquer custo. Traz à tona o pensamento de Aníbal Quijano (filósofo peruano), quem critica a matriz racional da colonialidade. Pérez Zavala responde afirmando que Roig não inaugura os processos de dependência da metrópole, antes ao contrário, trabalhou na direção de superação da dependência colonial. Roig não nega nem a universalidade, nem a racionalidade. Trata-se de ver qual tipo de universal, se é opressivo ou não, liberando-se de universais opressivos.

Outra questão de ordem do Wanderson Flor diz respeito ao elogio a mestiçagem, ao que aproximaria os latino-americanos. Assevera que, enquanto outros países latino-americanos contaram com a presença de elites crioulas, não tivemos crioulos no Brasil, sendo aqui a mestiçagem atravessada pelo ideal de branqueamento, negador das matrizes indígena e negra da cultura. Acaba que no Brasil a mestiçagem foi elogiada em outro sentido, num sentido sutil e perigoso. Como fica então a força da mestiçagem para organizar a perspectiva brasileira e responder ao desafio da emancipação? Pérez Zavala responde então que o branqueamento no Brasil coloca a presença do conflito, importante vetor para a crítica.

Maximiano Basso declara ser encantadora a filosofia latino-americana, principalmente a de língua espanhola. A partir de Fornet-Betancourt, para quem existem muitas formas de razão e grandes culturas com seus com grandes mitos, dentre as quais a filosofia pré-americana e a filosofia pré-socrática, dirige uma crítica a Roig e pergunta se Roig não termina por aderir ao padrão greco-europeu da razão. Pérez Zavala responde que a questão das formas de razão e de cultura não está bem definida em Roig, como está em Fornet-Betancourt. Aponta, porém, a separação entre razão e opressão em Roig.

Sobre a questão da filosofia nas universidades, Basso pergunta o que podemos fazer para enriquecer a filosofia e conseguir transformar e transpor as universidades. Pérez Zavala responde que nos moldes da filosofia da liberação ou da teologia da liberação, precisamos da liberação das universidades, da abertura da noção de filosofia, da ampliação de campos, para além dos campos do currículo e das disciplinas, alcançando o que se passa fora das universidades, no vínculo social da filosofia.

Cleide Bernardes pergunta se a reclamação de direitos pelos dominados não incorreria na mesma linguagem de universais dominadores. Pérez Zavala responde que é preciso evitar cair num conceito único de universal, evitando os perigos do fechamento dos universalismos e da abertura aos relativismos. Universais não são iguais. Há razão nos universais, bem como clareza de ideias, definição de termos, força argumentativa. Afirma ainda que é imprescindível seguir esclarecendo os sentidos de universal.

Agnaldo Portugal pergunta se não é legítimo e mais interessante pensar nas contribuições dos brasileiros para a filosofia em geral (filosofia no Brasil), ao invés do modo brasileiro de fazer filosofia (filosofia do Brasil). Pérez Zavala responde ser mais profícuo reunir filósofos latino-americanos em torno de linhas comuns, em torno, por exemplo, das histórias dos colonizados, porque, afinal, fomos todos colônias, e ainda seguimos sendo. Ao invés de filosofias nacionais, propõe pensar em filosofias regionais, no que experiências de colonização juntam, inevitavelmente, os latino-americanos.

Portugal também pergunta se não fica pobre e restrito o alcance do saber filosófico acerca do Brasil e da América Latina, sem apropriar-se do saber das ciências sociais (antropologia, história, sociologia, ciência política). Pérez Zavala responde destacando as experiências proveitosas da reunião das ciências sociais e humanas em torno das várias edições do congresso Corredor de Ideias, reunindo, a propósito, pensadores latino-americanos no Brasil em setembro desse ano, na Unisinos. Por último, defendeu para a filosofia o papel de coordenar o movimento de pensamento, de considerar a constituição das ideias em sentido mais amplo, de reunir os vínculos sociais da filosofia. Arremata defendendo ser a história das ideias indispensável para a filosofia.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Conferência de Abertura: A Ideia de Filosofia Brasileira. Luiz Alberto Cerqueira

Luiz Alberto Cerqueira
Centro de Filosofia Brasileira, IFCS, UFRJ

A Ideia de Filosofia Brasileira como Problema

O que é isso - “filosofia no Brasil” ou  “filosofia brasileira”?
Ambas as expressões significam o mesmo. Queremos tratar do que os gregos denominaram φĭλοσοφία, cuja origem é a admiração (qαυμαστόν), e cuja possibilidade de conhecimento é a indiferença do sujeito em relação a seu corpo e ao entorno físico: “O filósofo [...] só de corpo está presente na cidade em que habita” (PLATÃO, Teeteto, 174 a). 

Indiferença e Vida Teórica
Essa indiferença não é alienação; é a condição de o indivíduo ver a si mesmo como sujeito de conhecimento, e de ver um problema como problema universal. No Protréptico, Aristóteles compara a atividade do estudioso absorto na ciência pura ao pasmo dos theoroí, como eram chamados os espectadores nos jogos de Olímpia: nesse contexto, qewre?n significa tanto o ato de assistir a um espetáculo quanto a contemplação e a pesquisa no sentido “teórico”.

Indiferença e Conhecimento de Si
Essa indiferença, que caracteriza a vida teórica para o efeito (i) de tornar o indivíduo sujeito de um saber universal, e (ii) de libertá-lo dos próprios apetites, que o escravizam, para torná-lo apto para a vida em sociedade, essa indiferença é, por si mesma, a evidência das condições subjetivas de todo o conhecimento teórico e prático. Eis a resposta de Sócrates à questão “O que é conhecimento?” - “Conhece-te a ti mesmo”.

A Liberdade da Indiferença
1. Quando aprendemos uma ciência, não incorreremos em erro se dermos nosso consentimento apenas ao que entendemos de maneira clara e distinta;
2. Mas se, por um lado, nosso entendimento é limitado apenas ao que se nos apresenta, por outro, a nossa vontade parece ilimitada em nosso poder livre de agir indiferentemente de um modo ou do modo contrário;
3. Por essa liberdade da indiferença, que conheço em mim, posso impedir a mim mesmo de consentir naquilo que ainda não entendo claramente, se tenho dúvida.

Liberdade da Indiferença e Ação Moral
“Neste mundo racional do homem, o primeiro móbil de todas as nossas ações é o conhecimento de nós mesmos [...] ainda que o homem verdadeiramente é composto de corpo e alma, quem se conhece pela parte do corpo ignora-se, e só quem se conhece pela parte da alma se conhece [...] separemos [...] ao senhor do escravo [...] livre a alma dos embaraços e dependências do corpo, obra com outras espécies, com outra luz, com outra liberdade [...] Oh que obras seriam as nossas tão outras do que são!” (VIEIRA, As Cinco Pedras da Funda de Davi, 1676).

Liberdade da Indiferença e Vida Civil
• Entretanto, para se compreender o papel da liberdade na dinâmica do saber e na formação do sujeito moral, não basta ressaltar a necessidade do conhecimento de si: é preciso levar em conta que o conhecimento de si, por sua vez, sofre a influência da cultura a que o sujeito pertence como povo.
• “O corpo não nos foi dado como uma condição de saber e de querer, mas como uma sujeição que coarctasse esse poder livre, de que abusaríamos, chamando-nos à vida prática” (MAGALHÃES, Fatos do espírito humano, cap. XV).

Filosofia e Nacionalidade
Ao observarmos a necessidade do conhecimento de si a partir de dentro dos limites da cultura a que o sujeito pertence como povo,  queremos mostrar a liberdade da indiferença como condição essencial para o uso teórico da razão na mesma medida em que a nacionalidade do sujeito - o ser grego, alemão, francês, brasileiro, etc. – é algo absolutamente acidental.
Por ser acidental, a nacionalidade do sujeito pensante não impede nem o seu próprio uso teórico da razão, nem a sua visão dos problemas vividos como problemas universais. 

Formação Filosófica e Consciência de Si como Povo
Quando digo “filosofia brasileira” ou “filosofia no Brasil” refiro-me precisamente a uma instância da ideia de que toda a formação filosófica se dá dentro dos limites da natureza histórico-cultural do sujeito, em termos de princípios e valores. 

Centro de Filosofia Brasileira
IFCS/UFRJ

segunda-feira, 25 de abril de 2011

PROGRAMAÇÃO COMPLETA DO EVENTO

PROGRAMAÇÃO COMPLETA DO EVENTO

39ª SEMANA DE FILOSOFIA DA UNB, “FILOSOFIA NO BRASIL”.
De 6 a 10 de junho de 2011. Memorial Darcy Ribeiro, Campus Universitário



DIA 6 DE JUNHO

19 horas. ABERTURA OFICIAL DO EVENTO.
Homenagem a o professor ANTONIO PAIM, com a sua presença.
Conferência inaugural do professor LUIZ ALBERTO CERQUEIRA (UFRJ). "A Idéia de Filosofia Brasileira em Função da Vivência de Problemas".


DIA 7 DE JUNHO

9 a 11,30. Conferência do professor JOSÉ MAURICIO DE CARVALHO (Universidade federal de São João del Rei). “A Questão Metodológica na Filosofia Brasileira”.
 
14 a 17,30. MESA EUDORO DE SOUZA: SOBRE A QUESTÃO HISTÓRICA Coordenador da mesa: Coordenador da mesa: Professor Julio Cabrera. Participantes: professores Paulo Margutti, Luiz Cerqueira, José Maurício e Licenciado Bruno Borges (da Organização do Colóquio Eudoro de Souza). Descrição: As grandes linhas históricas do pensamento brasileiro; alguns clássicos modernos e contemporâneos do pensamento brasileiro e latino-americano; o resgate das fontes reflexivas desse rico acervo cultural, e temas correlatos.

19 horas. Conferência do professor PAULO MARGUTTI (Ex-UFMG e FAJE). "As relações entre o pensamento filosófico brasileiro e o ensino de filosofia no Brasil".


DIA 8 DE JUNHO

9 a 11,30. Conferência do professor CARLOS PÉREZ ZAVALA (Universidad Nacional de Rio Cuarto - Argentina). “Arturo A. Roig y la decolonialidad”.

14 a 17,30. MESA DARCY RIBEIRO: SOBRE A QUESTÃO POLÍTICA. (Coordenadora da mesa: Larissa Benetti. Participantes: professores Wanderson Flor, Julio Cabrera, Jonatas Álvares (Pós-graduação) e Vinicius Saldanha (Graduação). Descrição: Atuais condições sociais, políticas e culturais das atividades filosóficas em países dependentes como os latino-americanos; natureza, formas e alcances do filosofar das universidades, as possibilidades de novos tipos de relacionamento com o pensamento europeu e temas correlatos).

19 hs. Palestra do professor LEONARDO ALMADA (UFG). "Como podemos justificar hoje a idéia e o estudo de Filosofia Brasileira?".


DIA 9 DE JUNHO

9 a 11,30. Palestra do professor RODRIGO DANTAS (UnB). “Tradição, ruptura e criação: sob que condições é imprescindível filosofar?”

14 a 17,30. MESA PAULO FREIRE: SOBRE ENSINO DA FILOSOFIA (Coordenadora da mesa: Prof. Ana Miriam Wuensch. Participantes: professores Pedro Gontijo, Gabriele Cornelli e estudantes Thiago Costa (Pós-graduação) e Rafael Alves (graduação).  Descrição: Condições de formação de estudantes de filosofia no contexto da situação atual das atividades filosóficas no Brasil; possibilidades de um pensamento crítico e independente voltado para a realidade brasileira; a questão da filosofia no ensino médio e a importância do conhecimento da história da filosofia como diferencial profissional do professor de filosofia, e temas correlatos.

19 horas. Palestra do professor GONZALO ARMIJOS (Goiás). “El como y el qué del filosofar”.


DIA 10 DE JUNHO

9 a 11,30. Palestra do professor AGNALDO PORTUGAL (UnB). "Henrique Vaz e o caráter estruturalmente religioso do ser humano".

14 a 17,30. MESA OSWALD DE ANDRADE: LABORATÓRIO DE TEXTOS FILOSÓFICOS (Coordenadora da mesa: Telma Lago. Participantes: Grupo FIBRAL (CNPq) (coordenado por Julio Cabrera) e convidados: Marcus Valério XR (Fibral), Murilo Seabra, Gabriel Silveira e Roberto Sobral. Descrição: Apresentação, num viés de investigação experimental, de textos filosóficos em estilos alternativos (aforismos, imagens, diálogos, entrevistas, narrações, etc) como efetivas formas de reflexão).

19 horas. Conferência de encerramento do professor NELSON GOMES, sobre “Filosofia Universitária (Histórico do Departamento de Filosofia da UnB, a 25 anos da sua fundação)”. Com a presença de professores fundadores do departamento: CELESTINO PIRES, RAYMUNDO DAMASCENO, ESTEVÃO DE REZENDE MARTINS, GUILLERMO TERMENÓN e UBIRAJARA CALMON.

 
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